Parte 3 do conto Meu bebê

De Rafa Lima

No capítulo anterior

... Alice com gosto de Alice, viva, serelepe, colore um arco-íris interior, sorri para o céu, sorri para a chuva, sorri para o mendigo, quanta euforia!, quanta euforia!, quanta euforia!, gozar e sorrir, nada realmente importa!, “tão bom viver desse jeito”, mas, tempo, tubarão, mordida que não se vê até que dilacera, três meses, nada de gravidez, percebe-se apaixonada para valer, dependente, “é a hora de partir, não quero!, não quero! Mas tem de ser assim”, rapidim, esforça-se, tratamento de choque, “arranca, arranca, tira isso de mim!”, chora em segredo e desaparece da vida dele sem deixar vestígio, decepa-o de dentro de si antes que tudo esteja perdido, bruxa?

Continua...

Parte 3

Alice Holanda volta a malhar, a correr, a pedalar, viciada de novo em endorfina, a sentir-se gostosa, a usar roupa colada, até aprendeu a se masturbar sem se sentir culpada depois, “ai, ai, bom demais!”, em busca de oscilações de prazer, “não quero mais me submeter à disciplina militar do ser constante”, quer conversar com as amigas mas esbarra no decoro das mães de família, “como pude me tornar tão politicamente correta?”, o cotidiano enquanto clínica ginecológica dos princípios, portanto, o segundo amante, um gigante, um Atlas, músculos de estátua grega, arquétipo que lubrifica certas mulheres entre as pernas, “me ajuda a treinar?”, “é claro!”, o ser humano é hilário, o ato de suar a dois cria uma estranha cumplicidade entre as pessoas, dois meses depois do início do treinamento, eles se beijam no meio da rua, sob a iluminação do letreiro de uma loja de eletrodomésticos, “quer ir lá para casa?”, “você mora sozinho?”, “com a minha mãe, mas a essa hora ela está vendo todas as novelas possíveis para compensar a desistência de novas idéias”, os dois riem, a princípio, Lolo parecia um clichezão de jovem esportista, mas logo demonstrou inteligência, senso de humor e bom gosto, pouco a pouco, desabou o estereótipo, bom demais mergulhar nas profundezas da intimidade alheia, bom demais depois do enrijecimento do dia-a-dia resgatar a sensação de namoradinhos juvenis, “vamos, eu também quero”, Alice Holanda devora o atleta, ele fala sacanagens no ouvido dela, faz com que se sinta suja, divertidamente suja, sem mistificações, inteiramente em plano terreno, ela, em busca de paixões tão intensas que a pornografia se envergonha, “mete, seu safado, mete”, ele se exibe, banca o equilibrista de espetáculo circense para impressioná-la, mas a alegria do palhaço é ver o circo pegar fogo!, “me engravida”, o equilibrista despenca através do ar, “o quê?”, o homem-bala dispara contra a lei da gravidade, ou da gravidez?, de repente, o gozo vem fora, morno na pele dela, o equilibrista cai na rede de segurança, “por que você tirou?”, “ficou maluca? Eu não quero filho, não!”, “idiota, agora preciso me lavar para que o meu marido não descubra”, “marido?”, “sim, menino, está com medinho?”, “você tem marido e quer ficar grávida de outro? Está louca?”, “o filho é meu, o pai não interessa mais”, “que absurdo!”, “será?”, “é melhor você ir embora!”, ela se enfurece, “você não se cansa de pensar sempre as mesmas coisas?”, “que papo é esse? Não somos nada um do outro. Vamos nos comportar como se nada tivesse acontecido, ok?”, quanta decepção Alice Holanda guarda em seu íntimo pelos homens, “meninos, meninos, sempre tão meninos!”, veja, Wendy, é o Capitão Gancho, ho, ho, ho, hi, hi, hi, ha, ha, ha.

Continua...

Trecho 3 do romance O pervertido

De Rafa Lima

O delírio de fazer a cidade ficar grávida (Partes 27-28)

27.

O pervertido tem as horas de Sol da sexta-feira livres para refletir. Sente-se estranho pelo excesso de leveza. Tamanhas são a entrega e a confiança que tem na namorada que afinal optou por abrir mão de todo o talento para a promiscuidade e da capacidade de com pouquíssimas palavras possuir mulheres e mais mulheres de diferentes tipos, gostos e cores. É hora de explorar até as mais longínquas fronteiras do novo mundo descoberto em sua mente. Quem inventou Gina? Como são possíveis tantas delícias reunidas? Dias depois do último e quer acreditar que definitivo encontro clandestino com tia Leila, ele caminha no parapeito da cobertura do prédio mais alto da cidade. Não pretende pular. Ao contrário, supõe que agora sabe voar. Não há ninguém por perto. A não ser um homem de terno preto, gravata vermelha e (o que está acontecendo?) salto-alto cor-de-rosa que rapidamente se aproxima.
“O que foi? A minha presença atrapalha?”, questiona o indivíduo-surpresa. “Cuidado para não cair daí”.
“De onde eu conheço você?”, esforça-se para lembrar o pervertido.
“De um lugar onde a chuva é feita de cerveja”.
O pervertido se confunde.
“Você só se sente feliz com o que é óbvio”, prossegue o sujeito. “Por que não tenta novas formas de ver o mundo?”.
“O que acha que estou fazendo aqui?”, reage o pervertido de maneira defensiva. “Nos últimos meses, tentar novas formas de ver o mundo é tudo o que tenho feito”.
“Tem certeza?”.
Os dois se silenciam por um instante.
“Como se forja um espírito amoroso em um homem na violenta, banalizada e frenética sociedade contemporânea?”, questiona de repente o cara esquisito. “Já disse, cuidado para não cair lá embaixo!”.

Parte 2 do conto Meu bebê

De Rafa Lima

No capítulo anterior

... Além disso, você teve uma gravidez perigosa. Sei que está ansiosa em ter mais um filho. Mas não será melhor agora irmos com calma nesse assunto e nos concentrarmos na Clarissa?”, mais uma resposta negativa do marido!, mofoder, “está bem”, Alice Holanda finge aquiescer enquanto pensa: “Até parece! Cuida você dela e daquelas olheiras profundas!”.

Continua...

Parte 2

Agir, “amargurada pessoa de bem, fortaleza moral cheia de infiltrações causadas por tudo aquilo que teve de batalhar, negociar, abrir mão para se tornar quem é hoje, amargurada pessoa de bem”, “nem todas, minha amiga, nem todas são assim”, “medo, falta, perda, algo mais? Algo novo!”, agir, preparem as suas fogueiras!, ela é uma bruxa!, não há mais como esconder de que Alice Holanda quer fazer isso, sim, sim, sim, cuidado com ela!, muito cuidado com ela!, depois de tanto tempo encontra um novo eleito, a escolha se baseia em atração física combinada com a idealização que ela faz do rapaz através das revistas e livros que ele lê à mesa do café literário mais as roupas que ele veste, ela adora camisetas listradas!, códigos e mais códigos que não passam despercebidos aos olhos dela, sempre à hora do almoço, as duas solitudes ali se esbarram sem estardalhaço, observou-o em silêncio durante dias, descobriu uma rotina nos passos dele, até o seguiu pelas ruas, “caramba, sempre sozinho!”, planejou tudo, para a fogueira com ela!, tantas elucubrações insones que quase despertaram o marido empanturrado, paixonite, paixonite, o lugar ideal!, agora, difícil é a aproximação, que baita cara-de-pau, mas que fique claro que é ela quem manda, portanto, apenas lança o desafio, “olá”, “oi”, com sorriso, “ele é uma graça!”, ela pensa de perto, “em um dos próximos dez dias, vou voltar aqui. Nunca fiz isso. Nunca pensei que pudesse ser correto. Mas agora eu quero! Se você estiver aqui a essa hora da próxima vez em que eu entrar nessa cafeteria, vou com você ao lugar que escolher. Está a fim?”, ele, olhos arregalados, boca seca, sensação de armadilha, “é claro!”, novo sorriso, ela bate as asas, fadinha fodinha, e voa para longe, “homens, mesmo os mais inteligentes ou os mais bonitos, são tão previsíveis na dependência do desejo”, no sétimo dia, Alice reaparece, queimem-na!, queimem-na!, “vamos embora rápido!”, Leonardo, nada bobo, obedece, “casada?”, “isso importa?”, “nem um pouco”, ele desconfia, mas se submete, um motel à tarde em dia de semana, enquanto a massa trabalhadora se empenha em ganhar a sobrevivência, gerando lucro a uma microminoria que pode se dar ao luxo de freqüentar motéis à tarde em dias de semana, enquanto a massa trabalhadora lentamente se fode! Pelo menos assim se parece aos olhos de Alice Holanda. Depois de usufruir do amante-oásis, simulacro de liberdade, ela mesma!, “delícia, me morde, lindo, me beija”, quantos carinhos, o marido se torna tão enfadonho!, “chato, Juninho, chato!”, “o que eu fiz?”, “é exatamente o que você não fez”, “você, às vezes, é tão injusta comigo”, “sou?”, ela sabe que é!, mas não assume, “para quê? Para ele se achar mais perfeito ainda?”, reprime a sinceridade e devolve a raiva que sente causada pela constante falta de interesse a que o marido sequer se dá ao trabalho de esconder, mofoder, “aonde foram parar os bons tempos quando a gente se amava muito, mas muito, mas muito mesmo, da maneira mais simples de todas?”, ele se cala, internaliza como sempre, a filha começa a chorar de novo, só atrapalha, “deixa que eu vou”, surpreende a esposa, Clarissa de olheiras profundas causa vertigens à mãe, o bebêmenina a ofende mais e mais a cada dia que passa!, após novos encontros clandestinos com o amante, Alice goza, goza, goza, “por que gozar tanto assim? Deve estar desregulada”, “ah, você é sempre tão irônico!”, riem juntos, Alice, não mais apenas Alice Holanda, Alice!, Alice com gosto de Alice, viva, serelepe, colore um arco-íris interior, sorri para o céu, sorri para a chuva, sorri para o mendigo, quanta euforia!, quanta euforia!, quanta euforia!, gozar e sorrir, nada realmente importa!, “tão bom viver desse jeito”, mas, tempo, tubarão, mordida que não se vê até que dilacera, três meses, nada de gravidez, percebe-se apaixonada para valer, dependente, “é a hora de partir, não quero!, não quero! Mas tem de ser assim”, rapidim, esforça-se, tratamento de choque, “arranca, arranca, tira isso de mim!”, chora em segredo e desaparece da vida dele sem deixar vestígio, decepa-o de dentro de si antes que tudo esteja perdido, bruxa?

Continua...

Parte 1 do conto Meu bebê

De Rafa Lima

O quebra-cabeças da vida de Alice Holanda parece montado!, pronto-pronto como sempre se imaginou, de madrugada, enquanto o bem sucedido, boa gente, carinhoso, um pouco mais alcoólatra e barrigudo do que quando se conheceram e supostamente fiel marido dorme de pança cheia, oh, que maridão Alice Holanda encontrou para si, macho alfa dominador clássico, um homem que sabe se impor e ainda um experiente jogador de pôquer, ela pensa nas escolhas que o movimento natural da existência tomou por ela, casamento, emprego bem remunerado, acesso livre aos bens de consumo, à vida social, às pessoas e aos seus clubinhos existenciais particulares, contas e mais contas, o tédio, os sapos engolidos nos conflitos diários ou enfiados rabo adentro sem gel, a perda parcial e silenciosa do desejo sexual pelo homem amado, os amigos de sempre, os eventos de sempre, as novelas, os seriados e as comédias românticas de sempre, os sempres de sempre! E mais agora! Ela! Há dois anos, Alice Holanda deu à luz Clarissa, a primeira filha do casal, mas Alice Holanda, embora disfarce diante do marido, não esconde de si mesma a frustração que sente, não queria uma menina!, que idéia ridícula!, nunca quis, “as mulheres são muito falsas, dissimuladas e dependentes”, há tempos Alice Holanda imaginara que seria mãe de um rapagão bem apessoado, modelo de saúde, que se tornaria médico, advogado, economista, empresário ou jornalista, ou de um atleta olímpico que serviria de exemplo para a criançada, ou de um escritor sensível embora crápula que usaria o próprio talento com as palavras para seduzir centenas de mulheres, ou de um astrofísico renomado que ganharia o Prêmio Nobel, não importavam mais as antecipações que fizera contanto que fosse mãe de um menino!, “um menino, entendeu bem?”, rói-se em seu diálogo interior imaginário com o Criador da Luz, do Caos e dos espaços in-between (entre-espaços) onde se encontram os intelectuais, os roqueiros ou as drag queens, “além do mais, essa menina é muito estranha! Eu nunca tinha visto um bebê com olheiras desse tamanho!”. Alice Holanda imagina as olheiras como o símbolo de uma vida cheia de profundas questões, amores, reviravoltas, escolhas, vitórias redentoras, derrotas dilacerantes, mas vivas e pulsantes ao extremo. Sob a ótica da genitora, as olheiras do bebêmenina representam a promessa de uma existência plena movida pela rebeldia de uma pessoa preenchida pela impressão de vontade própria (por mais ilusória que possa parecer). Em silêncio, desde já, Alice holanda inveja a filha, porque desconfia de que um futuro grandioso aguarde Clarissa, muito mais interessante, intenso e livre do que o cotidiano em que a mãe se encontra acorrentada, cravado!, decide-se, ao ataque, pé-de-cabra emocional em mãos para arrombar a barreira da estagnação, “ei, Juninho, acorda!”, “o que houve, Alice? Aconteceu alguma coisa?”, “nada demais. Só quero pedir algo para você!”, “ah, Alice! Está de brincadeira? Eu estava dormindo. Trabalho amanhã cedo. Até parece que você não sabe disso. A Clarissa já está dando o maior cansaço. Agora, você também?”, “pára de drama, Juninho! Quero pedir algo bom! Muito bom!”, “é mesmo? O quê?”, “me come de um jeito que você nunca comeu antes!”, “hein?”, “me come de um jeito que você nunca comeu antes e faz um filho em mim!”, o homem acostumado a mandar se espanta, treme, corre dali, sim, sim, sim, corre dali para não arrancar os cabelos que ainda não caíram, quando percebe a grandeza da fêmea que silenciosamente o domina, “o que deu em você, Alice?”, “estou buscando novas formas de reconquistar a alegria de viver”, “mais do que já temos?”, “mais!”, “mais?”, “mais! Estou falando de novas motivações, Juninho!”, “desculpe, amor! Estou quebrado e o meu estômago está me matando. Além disso, você teve uma gravidez perigosa. Sei que está ansiosa em ter mais um filho. Mas não será melhor agora irmos com calma nesse assunto e nos concentrarmos na Clarissa?”, mais uma resposta negativa do marido!, mofoder, “está bem”, Alice Holanda finge aquiescer enquanto pensa: “Até parece! Cuida você dela e daquelas olheiras profundas!”.

Continua...

Fotos da peça Coleção de Centauros





























Clique na imagem para ampliar....

Parte 2 do conto: Deus desnudo

De Rafa Lima

A linguagem se mostra feminina

Deus está mudado. Após o princípio moralista, enveredou por séculos pelo caminho libertino, Deus sob pele de cordeiro (de Deus), a paixão e o amor. Quando se viu destituído da função soberana do Universo, após a maracutaia humana, Deus se lançou às experiências sensoriais criadas por quem Ele criou, “a paixão se dá pela urgência do vômito, o amor pela paciência da digestão de uma suntuosa feijoada, vomitar proporciona tonteiras, enjôos e alívio no fim, digerir pode causar sonolência”. E tome pé-na-bunda divina desacostumada ao que é descartável. Mesmo assim, houve época em que ficou viciadão em sexo. Por ter sido aprisionado no planeta dos homens, Deus se viu diante do desafio de preencher as horas seculares de vazio em solidão divina. Enquanto buscava amores e fodas, amores tão intensos que a pornografia se envergonha, uma vez que já se cansara da grandeza espiritual e toda aquela pompa, desocupado mas com excesso de criatividade, tornou-se o inventor de expressões idiomáticas que todo mundo conhece mas ninguém sabe de onde, “chegou a hora de a onça beber água”, “aí a gente vai ver quem tem mais garrafas vazias para vender”, “malandro é o cavalo marinho que finge que é peixe para não puxar carroça”, “o amor é uma flor roxa que só nasce no coração dos trouxas”, nada disso, nada disso, “o amor é uma flor roxa que começa na boca e termina nas coxas”, oh, deus, as mais recentes em temporada no Rio de Janeiro, sínteses eloqüentes da objetividade petulante do carioca tomada pela realidade das favelas, “já é”, “perdeu, playboy”, “fala tu”, entre outras, de ditados populares, “quem não chora não mama”, “feliz foi Adão que não teve sogra”, “em rio que tem piranha jacaré usa camisinha”, “quem tem boca vai à Roma”, ah, se você soubesse o contexto dessa, de palíndromos, que na língua portuguesa, idioma novinho, com frescor, elaborado, cheio de variações, revelou-se uma brincadeira deliciosa descobrir palavras e frases que possam ser lidas da mesma maneira tanto da esquerda para a direita quanto da direita para a esquerda, “anotaram a data da maratona”, “ovo”, “ovo é ovo”, “Ana”, “Ana é Ana”, “a torre da derrota”, “anilina”, “somávamos” e o espetacular “socorram-me subi no ônibus em Marrocos”, de um lado para o outro do outro para o um, delícia!, e, nos últimos tempos, de marchinhas carnavalescas, quem mandou dizer que Deus é brasileiro?, Deus produz cultura supérflua para o imaginário das multidões enquanto espera pelo sexo que sempre aparece, “oh! Belezinha!”, Ele inventa porque “cabeça vazia é oficina do Diabo”.

Amigos, amigos, negócios falidos

Deus escuta a campainha do microscópico telepata celular que carrega no bolso. É só falar no Diabo. Deus se emputece, “o que será? Não sou mais onipotente, porra!”, atende ao aparelho.
“Qual é o problema, Lúcifer?”.
“Calma, marido traído, calma!”.
O Diabo quer discutir questões jurídicas, como sempre, “vai gostar de tribunal assim lá em Washington!”, algo sobre um conceito de divisão territorial no terceiro milênio da giga-era cristã chamado Deus e o Diabo na Era digital”. Deus se entedia.
“Já falei que assuntos dessa natureza são perda de tempo. Vivemos em uma época diferente, meu querido”.
O Diabo reclama, insiste, como sempre.
“Você devia arrumar uma namorada, demônio”.
“Eu tenho várias”.
“Uma de verdade, que vire você do avesso!”.
“Não perco tempo com balelas”.
“Você é quem sabe”.
“Não torra, manda-chuva do nada!”.
Desligam, “pobre Lúcifer, não aceita que ele e Eu fomos passados para trás pela humanidade”.

Cigarrinho do tabaco eterno

Deus goza, a menina está apaixonada, o brinquedão e a caixota, Ele olha para a estante de autores. De repente, encontra o Grande Livro, Deus percebe o conteúdo da Bíblia sob a mesma ótica que as celebridades lançam sobre tablóides sensacionalistas que exploram a imagem alheia. É a hora. A menina vai ao banheiro. Deus precisa sair para se livrar da vontade de estrangulá-la por amá-lo tanto sem ao menos conhecê-lo, ao menos ela acredita que assim o seja, amém.
“Vou comprar cigarros”.
“Não demore, lindo”.
Deus não pretende voltar, tanto que à porta do apartamento da menina Ele já se metamorfoseou em mulher, negra e felina. Mais alguns passos, chega ao boteco do senhor Meia-noite de Oliveira.
“Bem-vinda, meu amor”.
“Olá, Meia-noite”.
“Como vai essa belezura?”.
“Assim, assim”.
“Problema com homem, filha?”.
“Estou buscando um novo lugar onde depositar a minha fé”.
“Deus, a humanidade, o amor, o sonho!”.
“Já passei por todos esses”.
“Está escondendo o jogo, filha? Parece tão jovenzinha”.
“As aparências só enganam”.
O silêncio larga o crucifixo no chão.
“Senhor Meia-noite?”.
“Pois não, minha linda”.
“Por que o senhor carrega no canto da boca um cigarro que nunca acende?”.
“Não é assim a vida, minha filha, a eterna expectativa de um prazer que vicia mas que não se completa por inteiro?”.
Deus travestido de mulher acha graça.
“Você é ótimo, senhor”.
“Ótima é você, filha. Veio comprar meus cigarros?”.
“Sim”.
“Tome”.
“Aqui está”.
“O seu troco”.
“Não precisa, senhor”.
“Agradecido”.
“Eu que agradeço. Até”.
“Adeus”.
“A mim”.
“O quê?”.
A jovem de olhos brilhantes já havia desaparecido da visão do senhor Meia-noite de Oliveira.

Contragosto

Deus retorna à morada celeste, esquecera a televisão acesa, sim, sim, espera com avidez pelo momento em que conseguirá se libertar das formas humanas. Nunca entendeu o objetivo dos homens, talvez seja vingança pela Criação, por que torná-lo humano para abandoná-lo na essência profunda e apenas utilizá-lo como mecanismo de dominação? Se não fossem pela televisão e pelo amor, Deus cogitaria a idéia de suicídio. Deus não aprendeu a fazer amigos, vide o Diabo. Deitado, nu, com o controle remoto na mão, mas com controle pequeníssimo das próprias escolhas, “maldita hora em que inventei a ironia”. Deus sente tédio, porque a vida humana se constitui do vazio mais todos os paliativos por trás de onde as pessoas se escondem para evitar encará-lo. O ser humano é o carioca universal, “é bom demais ser carioca, por isso, eles são tão metidos”, Deus cospe no prato em que comeu, não quer mais ser carioca, brasileiro, americano, cristão, muçulmano, terráqueo, humano, Deus está melancólico. Talvez uma pequenina maldade ou uma batalha épica no estilo da barbaridade européia o animassem, mas, é sério, Deus não mais se interessa pela crueldade dos felizes. Reconhece em Si como é exibida a paudurescência dos vencedores. Deus sente sono, muito, muito sono, “como se livrar dessas identidades humanas de araque?”. Entre-sonho, “mais interessante é a cópula das baleias”. Deus sonha que todas as mulheres estão grávidas para sempre. Surpresa, é um pesadelo!, o ser humano é feliz, apesar da vista grossa autodestrutiva, e ri descaradamente, chamando Deus por vários nomes, sobrepujando o Criador, manezão, humilhando-o como uma criança mais velha faria a outra muito menor, “lá, lá, lá, lá, lá, lá”, o ser humano entope a boca divina com areia, Deus engasga, não respira, desespera-se, tenta tossir, não consegue, vai morrer, é humano, porra!, “socorro!”, Deus desperta com o coração acelerado, mas em absoluta contradição dá graças a Deus por ser apenas um sonho, ainda estar vivo, nu e tão apegado à idéia de aprender a ser humano.


Parte 2 do conto: Radiohead na Portela ( Psicotrópicos nos trópicos )

De Rafa Lima

Continuando...

“Stanley!”, de repente, ouve uma voz feminina chamá-lo. “Você se perdeu?”.
Ele concorda com um gesto de cabeça e se abaixa para beijar rapidamente nos lábios Tati (hipertexto, o rebolado da verdadeira garota nacional, ela não come fast-food, não vê filmes de Hollywood, não usa calça jeans, só bebe guaraná, adora palavras nativas como açaí, cupuaçu, acarajé e champanhe, não conhece o conceito de antropofagia cultural proposto por Oswald de Andrade na semana modernista de 1922, mas adora cair de boca sobre os gringos, nem percebe a contradição, “ih, puxa vida”, esqueceu de tomar a pílula hoje, é tão cheia de modelos de comportamento que não suporta as modelos de passarelas, assiste aos jogos da seleção brasileira de futebol emitindo gritinhos agudos toda vez que a bola se aproxima de uma área ou de outra, embora considere futebol muito chato, “para que noventas minutos de jogo?”, só fala mal de amiga quando não tem jeito mesmo, sente pena do povo sofrido, “de verdade, acredite, é verdade”, mas atravessa a rua quando vê um mendigo, não entende, mas adora os antiqüíssimos filmes de Godard, mais para contar para os outros que assiste coisas desse gênero e assim se sentir valorizada, quando ela mesma às vezes não sabe se dar valor, porque adora escolher homens canalhas, insensíveis, cachorrões mesmo, garantia contínua de sofrimentos e desvalorizações, faz da sua vida um RPG de novela, não transa sem camisinha com desconhecido, faz novos amigos diariamente, não trepa com ex-namorado de amiga, afinal, há uma ética, no máximo, no máximo, topa um boquetinho, não veio à praia anteontem mesmo com todo aquele sol que fez porque enfrentou uma fila danada para renovar o passaporte, acha o Brasil o melhor lugar do mundo, sem dúvida, “não há nada igual ao Rio de Janeiro”, mas adoraria morar em outro lugar, é categoricamente contra o turismo sexual, só rebola quando quer chamar a atenção) que está sentada sobre uma canga de cores psicodélicas, molhando a moça com algumas gotas salgadas.
“Ai, que água gelada!”, prossegue Tati em inglês. “O seu telefone tocou, enquanto você estava no mar”.
“Olha, o mate! Olha o galão! Olha o mateeee!”.
“Era o John. Deve estar na areia me procurando. Ele não tem o hábito de vir à praia, mesmo morando tão perto. Ele é mais inglês do que carioca”.
“Água, água, água! Coca-cola! Guaraná!”.
“Por que o seu amigo é tão mal humorado?”.
“Não fale assim dele, doçura. O John só precisa se soltar mais. Com licença. Oi, John, sou eu... está me ouvindo?... sim, estou, no mesmo lugar... sim, em frente à mesma barraca, só que mais perto do mar. Ah, vi você! Olha para a sua esquerda!”.
“Adoro o seu sotaque, sabia? Aliás, gosto de você todo!”.
“Olha a esfiha árabe. Delícia! Delícia! Esfiha, kibe!”.
O inglês sorri para esconder uma pitada de constrangimento. Nem de longe sente o mesmo pela moça. Tati é a terceira garota que conquista em uma semana, “não imaginei que as mulheres da elite carioca gostassem tanto dos estrangeiros”. Não demora, João e Flavinha (hipertexto, mulher inclassificável) se aproximam de Stanley e Tati, seguidos por Tonho (hipertexto, 44 anos, sete trabalhando na praia, diabético, sujeito batalhador de coração dividido entre dois amores, a filhinha de quatro anos chamada Laís que vive com a ex-esposa e, cante com ele como se estivesse no Maracanã, palmas lá no alto: “E ninguém cala esse nosso amor/E é por isso que eu canto assim/É por ti Fogo!”. Lindo! Emocionante! Mas como sofre o pobre diabo! Tem coisas que só acontecem ao Botafogo!) que carrega duas cadeiras de praia e uma barraca.
“Aqui está bom, patrão?”.
“Bota um pouco mais para cá! Não! Não! Mais para cá!”.
“Aqui?”.
“Não, não, aqui!”.
O homem obedece. Pronto. Finalmente, estão o mais próximo possível do que se pode considerar confortável no formigueiro de sensualidade em um dia de verão que é o ponto em frente à rua Joana Angélica na praia de Ipanema (hipertexto, a explosão demográfica transformou a garota de Ipanema do terceiro milênio em uma matrona magérrima e conservadora, cheia de filhos, netos, bisnetos e sobrinhos miseráveis que pedem esmola à tia célebre, parentes cujos nomes a musa popular sequer desconfia, porque são poucos os sortudos a quem ela permite a benesse de mamar em uma de suas oito tetas mutantes sustentadas pelo silicone).
“Que semaninha agitada, hein, Stanley?”, provoca João.
“Mas está se divertindo, não está, meu amigo? Já até pegou um bronzeado!”.
“Olha, o mate! Olha o galão! Olha o mateeee!”.
“Até fez sexo, não é, Jo-on?”.
As meninas explodem em risadas.
“Com quem?”, interessa-se Flavinha, nada deslumbrada por fazer parte de um diálogo em inglês. “Quer dizer que está me traindo?”.
“Nunca tive nada com você, sua doidinha. Vamos mudar de assunto, certo? Não quero falar sobre as minhas intimidades”.
De repente, Flavinha percebe a presença de um playboy wannabe pimp, com quem foi para a cama no mês passado, em uma noite de delírio, para rapidamente fingir ignorá-lo.
“Você não vai acreditar, Flavinha”.
“O que houve, Stanley?”.
“Ontem, nós três fomos à feijoada da Portela e em determinado momento o Jo-on começou a cantar Radiohead. Inacreditável!”.
“Está brincando? João, por que você não aceita o país em que vive?”.
“Porque não suporto essa ditadura do bem-estar, eu detesto o sol e a alegria obrigatória, foda-se, não me interesso pelo pôr-do-sol, nem pela luta popular por espaço, o Carnaval não passa de um circo megalomaníaco realizado para inglês ver”.
“Como pode?”, ofende-se Tati. “Que mente imperialista de merda a sua!”.
“Não me enche, tchutchuca!”.
“Quer jogar frescobol, Flávia? O pensamento unilateral nunca permite um bom debate de idéias”.
John, não mais João!, não mais João!, lança um olhar de desprezo à garota nacional, “ufa! Ufanismo!”, por instantes, ele delira, insolação na alma, deseja um eclipse solar que torne escuro o dia, quem sabe?, uma tempestade polar, o Rio de Janeiro abaixo de zero graus Celsius, “falar em limpeza étnica é considerado fascismo, mas que tal um pouco de educação para esse povo ignorante e orgulhoso dessa ignorância?, por exemplo, esse objeto se chama livro, mas não!, vivemos sob a égide da Santíssima Trindade, futebol, mulher e cerveja, não precisamos de mais nada, certo?”, enquanto isso, à beira-mar, “não é possível que não exista um intelectual sem atitude pernóstica”, pensa Flavinha, enquanto rebate à bolinha com a raquete “por favor, intelectual gente-boa carioca, venha para a luz! Vamos diminuir a distância entre espaços que não se separam mesmo com túneis como o Rebouças, nem com a divisão simplista entre morro e favela”, ho, ho, ho, hi, hi, hi, ha, ha, ha, Cristo Redentor só tem duas mãos que juntas formam o maniqueísmo. Além? Ouvi dizer, vamos além algum dia? O Deus dessa cidade deveria ser um polvo, sim, sim, diversas vias, múltiplas idéias.
“Por favor, diga algo em português para eu praticar”, anima-se o jovem inglês, retirando o amigo do culto fascista.
“Eu seria capaz de cometer parricídio para trocar de lugar com você na sociedade inglesa, amigo”, John diz de modo acelerado.
“O quê? Repete mais devagar”.
“Eu seria capaz de cometer parricídio para trocar de lugar com você na sociedade inglesa”.
“Não entendi direito. Traduz, amigo”.
“Eu disse que estou planejando me mudar para a Inglaterra”.
“Está mesmo?”.
“De fato”.
“Está querendo bancar o dominador?”.
“Cale a boca, Stanley!”.
“Você deveria valorizar mais as maravilhas da sua cidade”.
Três segundos de escárnio silencioso.
“Você precisa aprimorar os seus gostos”.
“O Rio de Janeiro é maravilhoso!”.
“O Rio de Janeiro é caótico!”.
“Paraíso!”.
“Prisão!”.
“Novo mundo libertador!”.
“Retrocesso histórico!”.
Num instante, são distraídos pelo grito de mais um vendedor de mate que passa carregando galões cheios da bebida e de gelo chacoalhante sobre os ombros, chonque, chonque, chonque. “De que servem o sol, a areia, o mar, os corpos, os olhares, o movimento se não se transformarem em liberdade?”. Liberdade, essa putinha com marquinha de biquini pela qual tantos povos se acostumaram a matar e morrer! “So exciting, so exciting!”.
“Caralhow!”, comemora o estrangeiro marijuanado em transbordamento, arranhando um palavrão em português. “Que lugar! Essa praia, essa gente, essa efervescência, tanta vida, tanta vida, oh, meu deus, John, veja aquela bunda! E aquela! E aquela!”.
“Veio fazer turismo sexual, meu amigo?”.
Stanley ri com ironia.
“O que é isso, amigo? Não é possível que logo você não entenda o que sinto! Tanta vida, tanto movimento, tanta alegria ao nosso redor, e você, Jo-on, fica com cara de guarda noturno!”.
“Vá se foder, Stanley! Em primeiro lugar, o meu nome não é Jo-on, é João! Fale direito se quiser ser respeitado pelos nativos. Ão e não on! Continue a me chamar de John que fica mais fácil para você. Em segundo, parece que pegou sol demais de novo. Quero ver se sentir tão bem amanhã, quando estiver parecendo um camarão como aconteceu nos primeiros dias!”.
“Nada disso. A sua amiga Tati passou protetor solar em mim”.
Hesitação.
“Verdade?”.
“Quem sabe?”.
O silêncio gostaria de beber um mate.
“Amanhã, eu não venho à praia”, sentencia John.
“Eu venho”, declara Stanley.
O londrino quer sentir como o carioca; o carioca quer ter os privilégios do londrino. O que vale mais? Trezentos ingleses assaltados, coagidos e humilhados no Rio de Janeiro ou um estudante brasileiro morto no metrô de Londres pela polícia inglesa cujo crime tentou encobrir?
We don’t forget!
O brasileiro não tem memória?

Trecho 2 do romance: O Pervertido

De Rafa Lima

A noite em que o desejo livre beira o desespero (Partes 33-36)

33.

Sim, sim, de que servem as borboletas se morrem tão rapidamente, desinventando o colorido do amanhã? Ele prossegue com a corrida para escapar do inesperado momento de vida que abruptamente o agarrou pelas costas. Sente agonia. Encontra-se em estágio avançado de revolta emocional contra o horizonte. Por enquanto, o pervertido consegue fugir do mata-leão que o destino tentou lhe aplicar. Sendo assim, corre para se proteger e continua correndo mais e mais para longe dali sem prestar atenção ao ambiente ao redor. Corre, pois a vida se moveu para uma nova fase à revelia da vontade dele. Corre, porque quer se afastar com uma pressa gritante do passado recente que em todos os lugares o persegue a lhe baforar sobre o cangote o sopro quente e ácido de sentimentos destruídos. Corre, pois gritar, bater e quebrar não funcionaram.
As pessoas nas ruas observam com estranha curiosidade aquele indivíduo amalucado que corre sem cessar e que às vezes escapa de se chocar, às vezes esbarra nos outros (ou seja, no segundo mendigo da noite que grita “Oh, seu doido!”, na velhinha de passo lento que se indigna e diz “Que falta de respeito!”, na madame metida à besta cheia de sacolas de lojas caríssimas que por temer a aproximação de ladrões exclama “que susto!” e em outro louco que corre na direção contrária e por segundos troca olhares de cumplicidade com ele para acabar berrando “vá pro inferno!”) ou em objetos (latas de lixo, canteiros de plantas, carros e motocicletas, barraquinhas de vendedores ambulantes...) que se atrevem a cruzar o caminho. Por longos minutos, a existência ganha a dimensão de uma imensa corrida sem rumo definido ao se mover pela pista de piso irregular que leva ao esquecimento. (Mas quem está isento de atravessar determinados instantes de total miséria emocional?). Entretanto, agora, o pervertido não se interessa pelos outros. Ele só quer deixar a vida anteriormente planejada para trás. Deseja categoricamente eliminar do pensamento as promessas de um futuro sereno e tranqüilo ao lado dela. Corre ainda mais. As pernas doem muito. Só reduz o passo quando um pensamento lhe invade a mente, proporcionando-lhe um certo alívio.
“Preciso gozar”, conclui. Pára de correr. As pernas parecem pesar toneladas. Olha ao redor. Está em uma movimentada rua cujo nome desconhece. Não faz idéia de como pode realizar o objetivo desavergonhado sem se comprometer ainda mais. Por que foi necessário que ela o deixasse abandonado desse jeito? O pervertido sente algo que se assemelha à manifestação física da violência cármica. “Mas Papai Noel eu fui um bom menino! Eu não mereço isso!”, poderia ser o seu lamento.
“Foda-se! Deixa para lá!”, prefere dizer ao tentar se convencer pela décima quinta vez de que vai superar os eventos ainda tão recentes na carne, na mente, na alma e na linguagem. O sol se retirou da cidade há pouco tempo. As raras mulheres nas proximidades caminham em ritmo acelerado por perceber que a noite sente muita fome hoje. O estômago noturno está roncando. Em silêncio, elas se assustam com a vibração no ar, uma espécie de carga elétrica invisível liberada por corpos daqueles cujo desejo foi drasticamente reprimido ao longo do dia. Temendo até mesmo a troca de olhares com indivíduos estranhos, as mulheres que se encontram no campo de visão do homem de beleza notável diante delas agem como se estivessem em constante fuga do que não conhecem, enquanto ele tenta com aflição extrema sem que o público feminino desconfie realizar uma ruptura com a nova realidade que se esforça em agredi-lo. Neste momento, o pervertido se satisfaria com qualquer uma das moças ao redor. Frenético, imagina um banquete de bocetas. Diferentes raças, tamanhos, gostos, penteados, níveis de lubrificação. Contudo rapidamente as mulheres desaparecem. “O mundo me considera um predador”, constata em tom sombrio.

Quadrinho Mendigo Pop - parte 2








Texto: Rafa Lima
Desenho: Marcelo Viglio



Clique no quadrinho para ampliar ...