Parte 3 de 5 do conto Radiohead na Portela (Psicotrópicos nos trópicos)

De Rafa Lima

“Stanley!”, de repente, ouve uma voz feminina chamá-lo. “Você se perdeu?”.
Ele concorda com um gesto de cabeça e se abaixa para beijar rapidamente nos lábios Tati (hipertexto, o rebolado da verdadeira garota nacional, ela não come fast-food, não vê filmes de Hollywood, não usa calça jeans, só bebe guaraná, adora palavras nativas como açaí, cupuaçu, acarajé e champanhe, não conhece o conceito de antropofagia cultural proposto por Oswald de Andrade na semana modernista de 1922, mas adora cair de boca sobre os gringos, nem percebe a contradição, “ih, puxa vida”, esqueceu de tomar a pílula hoje, é tão cheia de modelos de comportamento que não suporta as modelos de passarelas, assiste aos jogos da seleção brasileira de futebol emitindo gritinhos agudos toda vez que a bola se aproxima de uma área ou de outra, embora considere futebol muito chato, “para que noventas minutos de jogo?”, só fala mal de amiga quando não tem jeito mesmo, sente pena do povo sofrido, “de verdade, acredite, é verdade”, mas atravessa a rua quando vê um mendigo, não entende, mas adora os antiqüíssimos filmes de Godard, mais para contar para os outros que assiste coisas desse gênero e assim se sentir valorizada, quando ela mesma às vezes não sabe se dar valor, porque adora escolher homens canalhas, insensíveis, cachorrões mesmo, garantia contínua de sofrimentos e desvalorizações, faz da sua vida um RPG de novela, não transa sem camisinha com desconhecido, faz novos amigos diariamente, não trepa com ex-namorado de amiga, afinal, há uma ética, no máximo, no máximo, topa um boquetinho, não veio à praia anteontem mesmo com todo aquele sol que fez porque enfrentou uma fila danada para renovar o passaporte, acha o Brasil o melhor lugar do mundo, sem dúvida, “não há nada igual ao Rio de Janeiro”, mas adoraria morar em outro lugar, é categoricamente contra o turismo sexual, só rebola quando quer chamar a atenção) que está sentada sobre uma canga de cores psicodélicas, molhando a moça com algumas gotas salgadas.
“Ai, que água gelada!”, prossegue Tati em inglês. “O seu telefone tocou, enquanto você estava no mar”.
“Olha o mate! Olha o galão! Olha o mateeee!”.
“Era o John. Deve estar na areia me procurando. Ele não tem o hábito de vir à praia, mesmo morando tão perto. Ele é mais inglês do que carioca”.
“Água, água, água! Coca-cola! Guaraná!”.
“Por que o seu amigo é tão mal humorado?”.
“Não fale assim dele, doçura. O John só precisa se soltar mais. Com licença. Oi, John, sou eu... está me ouvindo?... sim, estou, no mesmo lugar... sim, em frente à mesma barraca, só que mais perto do mar. Ah, vi você! Olha para a sua esquerda!”.
“Adoro o seu sotaque, sabia? Aliás, gosto de você todo!”.
“Olha a esfiha árabe. Delícia! Delícia! Esfiha, kibe!”.
O inglês sorri para esconder uma pitada de constrangimento. Nem de longe sente o mesmo pela moça. Tati é a terceira garota que conquista em uma semana, “não imaginei que as mulheres da elite carioca gostassem tanto dos estrangeiros”. Não demora, João e Flavinha (hipertexto, mulher inclassificável) se aproximam de Stanley e Tati, seguidos por Tonho (hipertexto, 44 anos, sete trabalhando na praia, diabético, sujeito batalhador de coração dividido entre dois amores, a filhinha de quatro anos chamada Laís que vive com a ex-esposa e, cante com ele como se estivesse no Maracanã, palmas lá no alto: “E ninguém cala esse nosso amor/E é por isso que eu canto assim/É por ti, Fogo!”. Lindo! Emocionante! Mas como sofre o pobre diabo! Tem coisas que só acontecem ao Botafogo!) que carrega duas cadeiras de praia e uma barraca.
“Aqui está bom, patrão?”.
“Bota um pouco mais para cá! Não! Não! Mais para cá!”.
“Aqui?”.
“Não, não, aqui!”.
O homem obedece. Pronto. Finalmente, estão o mais próximo possível do que se pode considerar confortável no formigueiro de sensualidade em um dia de verão que é o ponto em frente à rua Joana Angélica na praia de Ipanema...

Continua...

... Cinemateca do Rafa (7)

Nos cinemas, vale muito a pena ver

- O lutador
- Direção – Darren Arronofsky (2008)

A obra desse diretor é marcada pela elaboração de temas complexos como em Pi, Réquiem para um sonho e Fonte da vida, mas O lutador prima pela simplicidade narrativa, apostando na força da história. Sim! O drama do pseudo-herói dos ringues de luta livre, interpretado com incrível sutileza por Mickey Roorke, acometido por uma severa doença cardíaca que o leva a resgatar novos sentidos de existência em substituição aos espetáculos coreografados de delírio e violência. É de cortar o coração a relação do brutamontes com uma filha abandonada há anos e que agora o rejeita. Além disso, a relação ambígua (só o corpo/também a mente) dele com uma garota de programa interpretada pela deliciosa Marisa Tomei dá a dimensão de que o romance nada mais é do que uma idealização no mundo dos homens. Sim, trata-se de um filme de aceitação do próprio caminho!

O sentimento não pode parar!

Veja Family guy, leia Dostoiévski, ouça David Bowie, faça sexo com cuidados básicos, volte sempre ao Fantástico mundo do Rafa!

Anuncie aqui e tenha bons frutos no amor! (Ou aprenda fórmulas de ironia)

,,, Enquanto isso em Pessoinhas

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9 comentários:

Anônimo disse...

hipertexto, o rebolado da verdadeira garota nacional, ela não come fast-food, não vê filmes de Hollywood, não usa calça jeans, só bebe guaraná, adora palavras nativas como açaí, cupuaçu, acarajé e champanhe, não conhece o conceito de antropofagia cultural proposto por Oswald de Andrade na semana modernista de 1922, mas adora cair de boca sobre os gringos, nem percebe a contradição, “ih, puxa vida”, esqueceu de tomar a pílula hoje, é tão cheia de modelos de comportamento que não suporta as modelos de passarelas..."

que delícia de descrição da garota nacional, estou rindo muito!

Anônimo disse...

Muito bom! Muito bom! Ri demais com a descrição da garota nacional. Aplausos para você! Beijo.

Anônimo disse...

Bom demais o filme, boa escolha! O quadrinho está muito divertido. Como consegue produzir tanto?

Anônimo disse...

Filmaço!

Unknown disse...

Meu filme preferido de 2009 ate agora.
Bah, mas vc ja sabia disso :P

Unknown disse...

Tudo bem que o filme é de 2008 hahah
Mas eu vi em 2009 então foda-se!

Anônimo disse...

Louca para ver o filme. Você deveria receber uma comissão da distribuidora.

Anônimo disse...

Radiohead!

Anônimo disse...

Já vi esse filme. Foda!